Estrada Real Petrópolis (RJ) a Ouro Preto (MG) a Diamantina (MG). Janeiro 2017
1ª ETAPA |
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CAMINHO NOVO 438 km |
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PETRÓPOLIS (RJ) A OURO PRETO (MG) |
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CAINHO NOVO 438 km |
DATA |
TRECHOS |
KM DIA |
TOTAL DIA |
TOTAL ACUM |
27/12/2016 |
Petrópolis
(RJ) a Itaipava (RJ) |
32 |
66 |
66 |
|
Itaipava
(RJ) a Paraíba do Sul (RJ) |
34 |
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28/12/2016 |
Paraíba
do Sul (RJ) a Monte Serrat (RJ) |
21 |
69 |
135 |
|
Monte
Serrat (RJ) a Matias Barbosa (MG) |
24 |
||||
Matias
Barbosa (MG) a Juiz de Fora (MG) |
24 |
||||
29/12/2016 |
Juiz
de Fora (MG) a Ewbank da Câmara (MG) |
48 |
68 |
203 |
|
Ewbank
da Câmara (MG) a S. Dumont (MG) |
20 |
||||
30/12/2016 |
Santos
Dumont (MG) a Antônio Carlos (MG) |
56 |
56 |
259 |
|
31/12/2016 |
Antônio
Carlos (MG) a Barbacena (MG) |
13 |
41 |
300 |
|
Barbacena
(MG) a Ressaquinha (MG) |
28 |
||||
01/01/2017 |
Ressaquinha
(MG) a Carandaí (MG) |
30 |
62 |
362 |
|
Carandaí
(MG) a Queluzito (MG) |
32 |
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02/01/2017 |
Queluzito
(MG) a Conselheiro Lafaiete (MG) |
20 |
44 |
406 |
|
Cons.
Lafaiete (MG) a Ouro Branco (MG) |
24 |
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03/01/2017 |
Ouro
Branco (MG) a Ouro Preto (MG) |
32 |
32 |
438 |
27/12/2016 |
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1°dia |
Petrópolis (RJ) a Paraíba do Sul (RJ) |
66 km |
Acordei cedo e fui
[a pé] ao Centro de Informações Turísticas de Petrópolis (RJ) (296.044 habitantes). Censo 2010
retirar o Passaporte da Estrada Real. O quiosque abriu com meia hora de atraso.
De lá, voltei ao Hotel Grão Pará, arrumei as tralhas e, pela Estrada
Mineira, uma rua suja, escura e favelizada, realizei
as primeiras pedaladas para alcançar a distante Diamantina (MG), (47.952
habitantes. Censo 2010), 942 quilômetros
à frente.
A Estrada Mineira
abrigou os trilhos da (*) Estrada de Ferro Mauá, por onde
circularam os trens que deixavam o Rio de Janeiro e se destinavam a Carangola
(MG), Ponte Nova (MG) e Ubá (MG). Era o chamado “Expresso Mineiro”, que partia
[diariamente] da capital do Estado, pontualmente às 7h 48.
(*) A Estrada de Ferro Mauá, oficialmente denominada Imperial Companhia de Navegação a Vapor e Estrada de Ferro de Petrópolis, foi a primeira ferrovia a ser estabelecida no Brasil. Inaugurada em 30 de abril de 1854, seu trecho inicial [14,5 quilômetros], ligava o Porto de Mauá a Fragoso, hoje bairro de Inhomirim, Baixada Fluminense. A EFM foi construída por Irineu Evangelista de Sousa (1813 – 1889), o Barão de Mauá. A extensão até Petrópolis e Areal, onde se iniciava subida da serra por cremalheira, aconteceu em 1856. Disponível em: <http://www.ihgi.org/426732463>. Acesso: 31/03/2017. Atravessei
o Túnel da Cascatinha, outrora um túnel ferroviário; hoje túnel rodoviário,
estreito e com pouco mais de 20 metros de extensão. Eram 10h 43. Na saída,
segui pela Rua Quissamã, passei [às 11h] pela antiga estação Ferroviária de
Cascatinha e cheguei a Itaipava [11h 57], Distrito de Petrópolis, também
conhecida como a “Búzios Serrana”. Com
inúmeros condomínios fechados e de alto padrão, pequenos shoppings, com sofisticadas lojas de grifes, Itaipava (pedra
redonda, em Tupi) é frequentada por parte da sociedade carioca. O distrito
ainda é famoso por abrigar muitas pousadas com ampla infraestrutura, hotéis de
alto padrão e sofisticados restaurantes. Parada para açaí em Correas,
bairro de Petrópolis (RJ).
Alcancei
o Castelinho de Itaipava às 12h 23 e almocei em Pedro do Rio, outro Distrito de
Petrópolis, que abriga a Cervejaria Itaipava. Pela Rodovia RJ - 123 passei por
Secretário, Subdistrito de Petrópolis. Eram 14h 15. Desse
ponto em diante, veio um trecho de 12 quilômetros em leito natural até o
Arraial de Inconfidência, 3º Distrito de Paraíba do Sul, também conhecido por Arraial
de Sebollas, onde visitei o Museu de Sacro de Tiradentes, uma pequena casa
na qual estão guardadas as relíquias do alferes Joaquim José da Silva
Xavier, o Tiradentes (1746-1792), que, ao demonstrar sua insatisfação
com a Coroa Portuguesa e APREGOAR A
NECESSIDADE DA EMANCIPAÇÃO DA CAPITANIA DE MINAS GERAIS E NÃO DO BRASIL,
foi condenado à forca e, posterior, esquartejamento, no episódio histórico
conhecido como Inconfidência Mineira.
Conta
a tradição que a Coroa Portuguesa fez expor parte dos restos mortais do Alferes
Tiradentes nessa localidade na tentativa de inibir outras conspirações contra a
Coroa, principalmente no Caminho do Ouro. Às 17h atravessei Queima Sangue, bairro de Paraíba do Sul (RJ). Foto: Fernando Mendes. O bairro começou a ser criado após se tornar um ponto de parada dos tropeiros, pessoas que levavam o ouro através de muares. Quando os tropeiros passavam por Paraíba do Sul, eles fizeram de Queima-Sangue um ponto de parada para se abrigarem e aproveitaram o local para cauterizar as feridas das mulas e cavalos que utilizavam para transportar o ouro. Por isso, o bairro ganhou o nome de Queima-Sangue, pois naquele local era queimado o sangue dos animais para cicatrização. Segundo historiadores, o local exato deste ponto de parada é onde hoje está localizada a Praça Sebastiana Nunes. Disponível em:<http://blogdequeimasangue.blogspot.com/p/historia-do-bairro.html>. Acesso: 01/03/2017. Às 17h 25, outro bairro com nome estranho: Fernandó. Às 17h 45 cheguei a Paraíba do Sul (42.356 habitantes. Censo 2010) e hospedei-me no Hotel Itaoca. A tônica do 1º dia de viagem foi o calor senegalês
ao longo dos 66 quilômetros percorridos entre Petrópolis (RJ)
e Paraíba do Sul (PB). O trecho é muito urbano e, por extensão, bastante
movimentado. Dos quatro caminhos que constituem a Estrada Real, o Caminho Novo, que liga o Rio de Janeiro (RJ) a Ouro Preto (MG) tem, entre Petrópolis e Paraíba do Sul, 90% do percurso asfaltado. Foi um pedal bem tranquilo e com altimetria suave. Mais descidas do que subidas. Diamantina a 880 quilômetros.
Paraíba do Sul (RJ). Foto: Fernando Mendes. Setenta quilômetros percorridos sob forte calor, mas sem deixar o
moral cair. Os primeiros 20 quilômetros foram em trecho de
terra, com a estrada alternando pedaços bons e outros nem tanto. Existem muitas
chácaras e haras, todos bem cuidados. Ambiente bucólico regido pelos sons da
natureza. Impossível ficar indiferente.
A primeira etapa do dia terminou no povoado de Monte Serrat, pertencente ao Município de Levy Gasparian (RJ), às margens do Rio Paraibuna e aos pés da colossal Pedra do Paraibuna, grande formação rochosa em granito. É uma das mais belas atrações turísticas e naturais da região. Segundo dados fornecidos pelo IBGE, a pedra possui aproximadamente 890 metros de altura e, em vão livre, tem imenso paredão vertical, com cerca de 450 metros de altura. Esse monolito é o eterno vigilante da região. Pedra do Paraibuba. Foto: Fernando Mendes. Outro atrativo desse bairro do município
de Levy Gasparian (RJ) é a Igreja Nossa Senhora do Mont Serrat, inaugurada
em 1869 pelo imperador D. Pedro II, o segundo e último monarca
do Império, tendo reinado o País durante 58 anos (1831 – 1889).
Igreja Nossa Senhora do Mont Serrat e o Museu Rodoviário. Fotos: Fernando Mendes. Sua instalação, assim como as demais, serviu como local de parada na União e Indústria para substituição dos cavalos das diligências e descanso dos passageiros nas viagens entre Petrópolis (RJ) e Juiz de Fora (MG), no Segundo Reinado (1840 - 1889). Idealizadas por Mariano Procópio Ferreira Lage, a Estrada e as Estações foram construídas pela Companhia União e Indústria. Adquirido em 1950 pelo Departamento Nacional de Estradas de Rodagem para ser transformado em museu, tombado pelo Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1967 e aberto ao público em 1972, o museu, por meio dos objetos musealizados narra a trajetória dos primeiros caminhos e estradas, assim como dos transportes e meios de locomoção terrestres no País. Fonte: Zenilda Ferreira Brasil Dissertação de Mestrado defendida em 2015. Disponível em: < file:///C:/Users/sss/Documents/549-2301-1-PB.pdf>. Acesso: 01/03/2017. A partir de Monte Serrat, o Estado do Rio ficou para trás. Bem-vinda Minas Gerais. Ponte sobre o Paraibuna. Divisa RJ/MG. Foto: Fernando Mendes. Atravessei a Ponte sobre o Paraibuna e passei pelo
Registro do Quinto, um prédio em ruínas, situado estrategicamente nos limites naturais
entre Rio de Janeiro e Minas Gerais, à margem esquerda do Rio
Paraibuna, parada obrigatória para o recolhimento do Quinto, imposto
cobrado pela Coroa Portuguesa que incidia sobre o ouro que seguia para a Corte
(Rio de Janeiro). Registro do Quinto. Foto: Fernando Mendes. O prédio funcionava como uma espécie de alfândega interna, onde era feito o controle do tráfego de mercadorias e combate ao contrabando de ouro e diamantes. Eram também cobrados os direitos de passagem devidos à Metrópole. O prédio abrigou o Príncipe Regente, em 1822, quando por ali passou e nele nasceu a mãe do patrono do Exército brasileiro, o Duque de Caxias. Era também a passagem obrigatória do Tiradentes. Antes da Conjuração Mineira, Tiradentes foi também responsável pelo patrulhamento daquela área e conseguiu desmantelar caminhos alternativos usados pelos contrabandistas. Fonte: Guia Estrada Real para caminhantes: RJ a J. Fora. Olivé Raphael, Ed. Estrada Real, 1999 página 87 com adaptações).
A estação Paraibuna situa-se à margem esquerda do Rio Paraibuna, em território mineiro, muito próxima à divisa com o Estado do Rio de Janeiro. Os trens de passageiros pararam nessa estação entre 1874 e 1980. Atualmente, a linha opera com cargas e está sob a concessão da MRS Logística. Segundo Gutierrez L. Coelho: "o prédio da estação lentamente se vai, esquecido, sem manutenção e invadido. A decadência, infelizmente, é um fato. Continuam também lá, sem assistência de qualquer tipo, a caixa d'água em ferro fundido, uma triste e já longínqua lembrança dos tempos da tração a vapor e o prédio majestoso da antiga aduaneira dos tempos do império. Comparando com fotos antigas a realidade hoje é realmente outra. Apenas a linha principal, não há mais desvios, está presente, desfilando por ela os trens de retorno de minério, uma serpente de gôndolas GDT vazias". Disponível em:<http://www.estacoesferroviarias.com.br/efcb_rj_linha_centro/paraibuna.htm>. Acesso: 01/08/2001. Almocei em Simão Pereira (MG) e carimbei o
passaporte em Matias Barbosa (MG), chegando a Juiz de Fora (555.284
habitantes. Censo 2010) junto com o pôr do Sol. Usina Hidrelétrica de Marmelos. Foto: Fernando Mendes.
A saída de Juiz de Fora (MG) foi demorada: 1 hora e
15 minutos para atravessar o perímetro urbano e chegar ao 1° Marco da Estrada
Real, no bairro de Barreira do Triunfo, às margens da BR-040. Após atravessá-la,
começou a primeira etapa do dia: de
Juiz de Fora (MG), em leito natural, até Ewbank da
Câmara (MG) (3.927 habitantes. Censo
2010), ex-Distrito de Santos Dumont
(MG), emancipado em 1962.
Trecho entre Juiz de Fora (MG) a Santos Dumont (MG). Foto: Fernando Mendes. O caminho é quase todo paralelo à linha férrea da
MRS Logística, criada em 1996, quando o governo federal transferiu à
iniciativa privada, por meio de concessão e não privatização (*), a gestão do sistema ferroviário nacional. O
vai e vem de enormes comboios não cessa. Nesse trecho, a ER atravessa uma região na qual há uma
mescla de fazendas leiteiras e áreas de reflorestamento de eucaliptos. Existem
várias marcações da Transpetro avisando do Gasoduto subterrâneo que corre
paralelo ao caminho. (*) Ferrovias, assim como portos, aeroporto, rodovias, entre outros, são patrimônios da união e patrimônios não podem ser privatizados, e sim concedidos, por meio de leilões na Bovespa, à iniciativa privada, por prazos que variam de 25 a 30 anos, prorrogáveis ou não pelo Governo Federal. (Nota do Autor).
Comboio MRS Logística. Foto: Fernando Mendes. Vencidos os 48 primeiros quilômetros, cheguei a Ewbank da Câmara (MG) (3.904 habitantes. Censo 2010) e saboreei delicioso almoço. O feijão estava o néctar dos deuses. O segundo trecho teve 20 quilômetros pedalados em áreas de pasto e mata.
Ewbank da Câmara (MG). Paróquia de Santo Antonio. Fotos: Fernando Mendes. A chegada a Santos Dumont (MG) (47.559 habitantes. Censo 2010) foi mais cedo do que o previsto. Acomodei-me em excelente pousada no centro, a Pousada Dumont. Recomendo. 3° dia de viagem. Faltam 16 dias para Diamantina (MG). Hoje faz 15 anos que a cantora Cassia Eller partiu para cantar no céu. Diamantina (MG) a 732 quilômetros.
Chegada a Santos Dumont (MG). Foto: Fernando Mendes.
De Santos Dumont (MG) a Antônio Carlos (MG),
percorri 56 quilômetros, o maior trecho do Caminho Novo, majoritariamente em leito natural e escassos pontos de apoio. Os
primeiros 14 quilômetros foram pedalados [em asfalto] na Rodovia Federal BR
499 , que liga Santos Dumont (MG) à pacata Cabangu (Caa - mata +
bangu - escura). BR - 499 e Estação Mantiqueira. Fotos: Fernando Mendes. No quilômetro oito, abandonei a BR - 499 para
conhecer Mantiqueira, um subdistrito de Santos Dumont, cortado pela linha
férrea da MRS Logística. A localidade é muito pequena e nada de restaurante ou
similar que oferecesse uma refeição, àquela hora, bastante desejada. A estação
ferroviária, toda construída em tijolos, está em ruínas, a mesma ruína que se
encontra a malha ferroviária do País. Tirei algumas fotos e até fiz [celular]
um vídeo registrando a passagem de um comboio da MRS Logística. Contei os
vagões: 150. Estação Cabangu. Foto: Fernando Mendes. E
com o estômago clamando por víveres, voltei à BR 499 e percorri os 6,9
quilômetros finais [em asfalto] até Cabangu, localidade onde está o Museu Casa Natal de Santos Dumont 1, que não
foi o inventor do avião, ou o Museu de Cabangu, numa área de 365 mil m² que
guarda espelhos d’água, cascatas, quiosques, jardins, arvoredos e passarelas.
1 Existem ao menos documentos provando que os irmãos
Wright construíram aviões muito antes de Santos Dumont. [...] A distância do
principal voo do 14 – Bis foi 180 vezes menor que a do voo mais longo
dos Wright em 1905. Um ano antes de Santos Dumont criar o 14 – Bis, os
irmão americanos voaram cerca de cinquenta vezes, percorrendo uma distância de
39,5 quilômetros de uma só vez. [...] Em silêncio e secretamente Santos Dumont
deve ter percebido a verdade dolorosa: o 14 – Bis não voava. No máximo,
dava uns pulinhos. Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil /
Leandro Narloch, São Paulo: Leya, 2011, pp 251 e 255. Museu Santos Dumont em Cabangu. Foto: Fernando Mendes. É nesse cenário que está preservada, e aberta ao público, a casa onde
nasceu Alberto Santos Dumont (1873 – 1932), que não foi o inventor do relógio de pulso, 2 como muitos acreditam. 2 O Brasileiro certamente contribuiu para o relógio de pulso voltar à moda, mas a invenção do aparelho é de muito antes. Relógios assim eram comuns desde os tempos de Shakespeare – a rainha Elizabeth I (1533 – 1603) tinha um. Em 1868, a empresa Patewk Philippe reinventou a peça, que também foi usada por militares nos campos de batalha do século XIX, como na Guerra Franco – Prussiana. Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil / Leandro Narloch, São Paulo: Leya, 2011, p.252. A lanchonete estava fechada. Dancei no almoço. A Serra da Mantiqueira apareceu com todo seu esplendor. Quando estava próximo dos 1.000 metros de altitude, as araucárias começaram a dar o tom na paisagem. A natureza impera, com o som da passarada, das cachoeiras e dos bovinos soltos pelo caminho. Não existem pontos de apoio ao longo do trecho Cabangu a Antônio Carlos (MG), exceto um povoado, do qual não me lembro do nome, no qual consegui fazer a única refeição do dia: cebolitos com Coca Cola. Àquela altura dos acontecimentos, não podia me dar ao luxo de recusar “fina” iguaria. Fotos: Fernando Mendes. Às 15h 30 voltei à lida no pedal para encarar o trecho mais cascudo: subir a Serra do Trovão. O tempo mudou rapidamente, o dia virou noite e caiu uma chuva há muito desejada, que refrescou o ar quente e abafado. Em meio a raios e trovões, subi os quatro quilômetros da Serra do Trovão, todo em calcamento com pedras dispostas de forma irregular, sem maiores dificuldades. Pena não ter podido usar equipamento fotográfico com tanta chuva. Serra do Trovão. Foto: Fernando Mendes. Cheguei à pacata Antônio Carlos (MG) (11.4560 habitantes. Censo 2010) às 19h. Na Pousada Coliseu encontrei com quatro ciclistas de Vitória da Conquista (BA). Eles percorriam o Caminho Novo na direção contrária à minha: estavam indo de Ouro Preto (MG) para o Rio de Janeiro (RJ). A conversa fluiu fácil e o jantar, depois de um dia sem almoço, estava uma maravilha. Amanhã, último pedal de 2016. Sendo na Estrada Real, tá tudo certo. Diamantina (MG) a 676 quilômetros.
Antônio Carlos (MG). Foto: Fernando Mendes.
Foram 41 quilômetros pedalados
tranquilamente, à exceção da travessia da cidade de Barbacena (MG), com
trânsito frenético e todos parecendo apressados por conta do último dia do ano.
Inexistem marcos da ER ao longo do perímetro urbano. O jeito foi perguntar aos
nativos. E de pergunta em pergunta, cheguei ao bairro de Santo Antônio, depois
de subir uma ladeira das arábias. Lá do alto foi possível ver a BR-040, ao
fundo da paisagem. Uma descida, igualmente das arábias, me levou, por meio de
um bairro periférico e com asfalto esburacado, até a Lanchonete Roselanches,
localizada às margens da 040. Feijoada deliciosa no almoço, reforço no fôlego para encarar o trecho seguinte: Barbacena (MG) a Ressaquinha (MG), com 28 quilômetros. Os haras predominam. Cada um mais top que o outro. As formações da Mantiqueira são percebidas no visual e sentidas nas subidas, algumas longas, outras ainda maiores. Etapa marcada pela calma e pelos sons da natureza. Bem diferente dos sons urbanos e ensurdecedores de Barbacena (MG). Foto: Fernando Mendes. A chegada a Ressaquinha (MG) (4.834 habitantes. Censo 2010) foi tranquila e o último marco desse trecho da ER fica em frente ao Empório da Empada, que oferece muitas opções dessa iguaria. A cidade é atravessada pela BR-040 e o ponto alto é a Paróquia de São José, construída em 1939. As pinturas da igreja são de autoria do Padre Joseph Buttgens, influenciado pela arte hindu. Esse mesmo padre pintou a Catedral de Nova Déli, na Índia. Paróquia de São José. Foto: Fernando Mendes. Dirigi-me à Pousada Estrada Real para pernoite. A proprietária me informou que o estabelecimento não estava recebendo hóspedes porque a família iria comemorar a passagem do ano em Juiz de Fora (MG). O jeito foi me hospedar num hotel zero estrela, localizado no andar acima do Empório da Empada, de frente para a BR 040. E da varanda, assisti à tímida queima de fogos à meia-noite. Mesmo não me sentindo cansado, adormeci rapidamente. Viajar está entre as coisas que mais amo nesta vida. Se vivi muitas vidas, creio que passei a maioria delas viajando. Diamantina (MG) a 635 quilômetros.
1ª foto de 2017. Pedalei os primeiros 62 quilômetros de 2017 atravessando paisagens belíssimas. Nos primeiros 30 quilômetros até Carandaí (MG), girei por altitudes que variaram entre 1.050 e 1.200m. Estrada é larga e o solo bem compactado. Pareceu-me que ninguém quis sair de casa no primeiro dia do ano. Caminhos vazios. Imperava absoluto, pedalando entre fazendas leiteiras e plantações de eucaliptos. Às 12h 30, cheguei a Carandaí (25.044 habitantes. Censo 2010).
Fotos: Fernando Mendes. Almocei assistindo Escolinha do Professor Raimundo.
Depois, sob Sol saariano, tomei a proa de Queluzito
(MG). Pedalei por três quilômetros na BR-040 até
o Posto Fiscal, onde um marco da ER indica início do trecho [em terra] até
Queluzito (MG). A partir desse ponto a Estrada [Real] se eleva em relação
à BR-040, seguindo-a paralelamente,
corroborando para aquela tese, defendida por alguns que, a rodovia [BR 040], em
muitas etapas, foi construída sobre o leito da Estrada Real. Teorias à parte, o
percurso Carandaí (MG) a Queluzito (MG) mescla estradão e trilhas, que passam
por várias fazendas. Haja abre e fecha de porteiras.
Fotos: Fernando Mendes. Muito gado solto pelos pastos que atravessei, sempre acompanhado por
bandos de maritacas barulhentas. E ao fundo disso tudo, o esplendor da
Mantiqueira, com suas rochas graníticas refletindo a luz do Sol. Em Pedra do
Sino, Distrito de Carandaí (MG) e onde se localiza a fábrica do Cimento Tupi, a
Estrada Real intercepta a BR-040 perpendicularmente.
Atravessei-a, rumando para Cristiano Otoni (MG) (5.260 habitantes. Censo 2010). A
altimetria, até então suave, começou a mostra-se severa com um
trecho de trilha bastante técnico e inclinado [para cima]. O primeiro pedal do
ano não podia ser mais maravilhoso. Cheguei a Queluzito (1.947 habitantes. Censo 2010) na boca da
noite.
Fotos: Fernando Mendes. A Lua Nova, posicionada no Oeste, deu-me as boas vindas, lembrando o sorriso do gato da Alice no País das Maravilhas. Dia maravilhoso. Pedal aos sons da natureza. Diamantina (MG) a 487 quilômetros.
Penúltima etapa do Caminho Novo da Estrada Real, que liga o Rio de
Janeiro (RJ) a Ouro Preto (MG). O trecho Queluzito (MG) a Ouro Branco (MG) é
curto [45 quilômetros] e quase todo asfaltado. E veio a
transição da Serra da Mantiqueira para a Serra do Espinhaço. A altimetria
tornou-se cascuda e encardida.
À medida que Queluzito (MG) ficava para trás, as subidas foram mostrando
a cara. O ponto alto do dia ficou por conta da travessia de uma área de
reflorestamento com eucaliptos, sombreada e maravilhosa.
O restante da etapa aconteceu em pedaços fortemente urbanizados, como a
travessia de Conselheiro Lafaiete (125.421
habitantes. Censo 2010), com trânsito intenso e tumultuado, igual na
Tailândia.
Entre Lafaiete (MG) e Ouro Branco (MG), a Estrada Real é sobreposta à Rodovia MG 129, com sobe e desce frenético. Bem-vinda Serra do Espinhaço (*). (*) Considerada a única cordilheira do Brasil, a Serra do Espinhaço tem aproximadamente 1.000 quilômetros de extensão, parte em Minas Gerais e parte na Bahia. Possui o maior afloramento de calcário do País, jazidas de ouro, ferro, bauxita e manganês. Estima-se que sua idade geológica seja de 2,5 bilhões de anos. Funciona como divisor de águas. A leste, todos os rios tendem ao Atlântico, enquanto que a oeste inflam o sistema hídrico do São Francisco. A largura da Serra do Espinhaço varia de 50 a 100 quilômetros. Vales e picos são interpostos, configurando um terreno bastante acidentado. É Reserva da Biosfera, contém muitas áreas de proteção e outras de preservação, além de reservas particulares. Fonte: Brasília-Paraty, somando pernas para dividir impressões. Weimar Pettengil – Brasília – Editora Thesaurus, p.90. No acesso a Ouro Branco (38.249 habitantes. Censo 2010) localiza-se uma casa, em estilo colonial, na qual Tiradentes, em suas perambulações pela região, ocasião em que apregoava a necessidade de a Capitania de Minas Gerais [e não o Brasil] se livrar do domínio colonial português, usava-a para pernoite. É conhecida como Fazenda Carreiras. Fazenda Carreiras. Foto: Fernando Mendes. Como muitos dos monumentos históricos, de um
país sem memória histórica, a casa encontra-se abandonada.
Lamentável. Diamantina (MG) a 530 quilômetros.
O script do dia: distância curta [30
quilômetro], subidas longas e inclinadas. E que subidas. Trecho 100%
asfaltado, percorridos na Rodovia Estadual MG -129.
Igreja Matriz de Santo Antonio em Ouro Branco (MG) e Serra do Itatiaia. Fotos: Fernando Mendes. A Estrada corta a RPPN Serra de Ouro Branco
(Reserva Particular do Patrimônio Natural) e a altimetria é muito acidentada.
Na saída de Ouro Branco (assim chamavam o ouro ainda não bem formado), um
aclive de três quilômetros me levou a 1.560m de
altitude. Depois, descida animal me fez descer a 1.100m. E assim, nesse
incessante sobe e desce, sempre paralelamente à Serra do Itatiaia, um subgrupo
da Serra do Espinhaço, percorri o trajeto entre Ouro Branco (38.249 habitantes. Censo 2010) e Ouro
Preto (74.036 habitantes. Censo 2010).
Rodovia MG - 129. Fotos: Fernando Mendes.
(*) Vila Rica de Albuquerque e depois Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar de Ouro Preto. Em 1823, após a Independência do Brasil, Vila Rica, fundada em 1711, recebeu o título de Imperial Cidade, conferido por D. Pedro I do Brasil, tornando-se oficialmente capital da então província das Minas Gerais e passando a ser designada como Imperial Cidade de Ouro Preto. Em 1897, a mudança da capital para Belo Horizonte (MG) provocou um esvaziamento da cidade (aproximadamente 45 % da população), inibindo o crescimento urbano nas décadas seguintes, fato que contribuiu para preservação do seu Centro Histórico. Disponível em: <https://www.ouropreto.com.br/dados-gerais>. Acesso: 31/07/2017. Chegada a Ouro Preto (MG). Foto: Fernando Mendes. Início da segunda etapa da viagem: Ouro Preto (MG) a Diamantina (MG), agora pedalando pelo Caminho do Sabarabuçu até Cocais (MG). Diamantina (MG) a 442 quilômetros.
Saída para São Bartolomeu e Glaura. Foto: Fernando Mendes. Dia de
muito calor, subidas honestas, muito sombreamento pelo caminho e paisagens
lindas marcaram os 50 quilômetros da etapa. Até São
Bartolomeu, distrito de Ouro Preto (MG), a estrada empina fortemente para
cima nos primeiros quilômetros e a Antiga Vila Rica foi ficando pequena, lá em
baixo, dentro de um buraco.
Vencida
essa parede, caminho largo e muita sombra. Esse trecho termina no simpático e
bucólico distrito de “São Bartolomeu, acanhada joia barroca do século
XVIII”, anotou o Instituto Estrada Real em: http://www.institutoestradareal.com.br/cidades/sao-bartolomeu/143>. Acesso: 1º/03/2017.
Igreja Matriz em São Bartolomeu. Pousada São Bartolomeu. Fotos: Fernando Mendes. Nessa
acanhada joia, o tempo parece ter preguiça de
passar. A Igreja Matriz é uma das mais
antigas e imponentes de Minas Gerais. Lugar modesto e ruas com
calçamento de pedras. Gente simples e receptiva, sempre fazendo perguntas sobre
minha viagem. A
fartura de frutas na cidade induziu seus moradores à fabricação de doces
caseiros, tradição reconhecida na cidade. O ponto alto é a Festa da Goiaba
(doce caseiro mais popular da localidade). Tomei delicioso açaí e parti rumo a Glaura, outro Distrito de Ouro Preto, igualmente simpático e bucólico, com ruas calcadas e casas bem arrumadas. Na saída [de Glaura] para Acuruí, distrito de Itabirito (49.768 habitantes), uma chuva forte veio amenizar o calor. E veio com força, raios, trovões e granizo. Plec, plec e plec no capacete. Igreja Santo Antonio das Garças Brancas em Glaura. Fotos: Fernando Mendes. Primeira chuva do ano. Durou pouco, mas foi suficiente para refrescar e levar os restos de 2016. Uma ascensão de 200 metros nos quatro quilômetros finais para chegar a Acuruí. Isso me deu a dimensão do que é o Caminho do Sabarabucu. As paisagens que vi compensaram o esforço. Diamantina (MG) a 412 quilômetros. Acuruí, em tupi-guarani, significa "rio de pedras”.
Dia muito, muito puxado [55 quilômetros]. Na 1ª etapa, foram 20 quilômetros muito acidentados entre Acuruí e Rio Acima (9.924 habitantes. Censo 2010). Saída de Acuruí (MG). Foto: Fernando Mendes. Após o 3°morro que subi, parei de contá-los e passei a bebericar as belezas do caminho. Nada de eucaliptos. Muita mata nativa preservada, que produz sombra pela Estrada Real. Sombra necessária num dia tão quente.
Rio Acima (MG). Foto: Fernando Mendes. Inicialmente,
o distrito de Honório Bicalho se chamava Faria Garcês. O nome atual deriva de
uma estação
ferroviária construída em 1890, cujo
nome, Honório Bicalho, foi uma homenagem ao engenheiro que participou da
construção de obras públicas em portos e ferrovias brasileiras, sendo chefe na
construção da Estrada de Ferro D. Pedro II. Disponível em:
https://www.caminhoreligiosodaestradareal.com/honorio-bicalho-mg/. Acesso:
01/03/2017.
Fui obrigado a seguir para Raposos (16.230
habitantes. Censo 2010) pela Rodovia Estadual MG - 030. Motivo: esse
trecho da Estrada Real, que liga Honório Bicalho a Raposos, está interditado. Apenas 10
quilômetros. Fácil.
Estada Real paralela ao Rio das Velhas e sobre antigo leito ferroviário. Foto: Fernando Mendes.
Diamantina a 369 quilômetros.
Antes de partir para Caeté (MG), uma visita à
bicicletaria em Sabará (MG) (134.382 habitantes. Censo 2010) para substituir as pastilhas de freio. Depois,
carimbar o passaporte no Hotel Vila Real. Lá chegando, fui seduzido por
delicioso aroma de feijoada. Eram 12h. Decidi partir somente após degustar essa
iguaria. Sábia decisão. Melhor sair bem alimentado.
O trecho entre Sabará (MG) e Morro Vermelho [18
quilômetros], Distrito de Caeté (MG), é deslumbrante. Altimetria bem
plana em estrada de terra larga, igual à Ponte Rio - Niterói. Solo bem compactado e muita sombra. Em vários
trechos, a ER passa sob enormes pontes da Ferrovia da Vale do Rio Doce.
Pontes da Ferrovia da Vale do Rio Doce. Fotos: Fernando Mendes. Igreja de Nossa Senhora de Nazaré. Fotos: Fernando Mendes. A partir desse
ponto, a Estrada Real empina forte para cima. Passei a pedalar em altitudes que
variam entre 1.100 e 1.200m. Lá em baixo, os trilhos da Ferrovia da Vale vão
serpenteando o Espinhaço nas partes mais baixas.
Ferrovia da Vale. Fotos: Fernando Mendes. Não tardou para Caeté (MG) (43.739
habitantes. Censo 2010) aparecer dentro de um enorme buraco, como é
a localização de muitas cidades ao longo da Estrada Real. Cheguei ao centro às 18h, com
os sinos da Igreja Matriz de Bom Sucesso (século XVIII) anunciando a hora do
Ângelus.
Igreja Matriz de Bom Sucesso em Caeté (MG). Foto: Fernando Mendes. Segundo dia de Lua Crescente. A cada etapa cumprida desta viagem, a
certeza de que está sendo a mais maravilhosa de todas as jornadas que fiz
pedalando pela Estrada Real e seus quatro caminhos. Diamantina (MG) a 314
quilômetros.
A origem e o
significado da palavra Caeté provem da língua indígena e quer dizer: - mata
virgem, mato verdadeiro, segundo Teodoro Sampaio, citado por Nelson de Sena em
seu Anuário Histórico e Cartográfico de
Minas Gerais, edição de 1909, página 282.
Ironicamente, a parte mais difícil do trajeto - acredite se quiser - foi
uma descida com descenso 200 metros em quatro quilômetros. Impossível descer
essa ladeira nas condições descritas e montado na bike. Isto porque têm muitas
valas feitas pelo escoamento das águas das chuvas, além de pedras soltas, que
dificultam o equilíbrio. Morro abaixo, desembarcado da bike. Nem sempre as
subidas são as vilãs nos trajetos.
Cocais (MG). Foto: Fernando Mendes. Cheguei a Cocais (2.803 habitantes. Censo 2010) às 17h. Concluí o Caminho do Sabarabuçu, 2ª etapa das três que planejei percorrer pela Estrada Real. Difícil afirmar qual delas é a mais bela.
Acordei tarde, pois o trecho do dia foi curto, apenas 26 quilômetros, metade deles numa área de reflorestamento de eucaliptos. Ao terminar a travessia, a Estrada Real desemboca na Rodovia BR 262, que liga BH a Vitória (ES). Almocei num posto BR, atravessei a 262 e continuei pela Estrada Real - leito natural - até Bom Jesus do Amparo (5.923 habitantes. Censo 2010). Encontrei com meu grande amigo e Xará Fernando Gonçalves e a conversa fluiu fácil. A bike foi lavada e lubrificada. Diamantina a 244 quilômetros. Amigo e Xará, Fernando Gonçalves. Foto: Fernando Mendes.
Igreja de Nossa Senhora da Conceição. Foto: Fernando Mendes. Os primeiros 13 quilômetros até Ipoema (MG) foram feitos em asfalto novo
e altimetria com muitos sobe e desce. Almocei em Ipoema (MG) (2.746 habitantes, sendo 1.374 homens e
1.372 mulheres. Censo 2010), distrito de Itabira (MG). Fiz a química digestiva revendo a Igreja de
Nossa Senhora da Conceição. O Museu do Tropeiro, infelizmente, estava fechado,
pois era horário de almoço.
O trecho a seguir, com 15 quilômetros até o Distrito de Senhora do
Carmo, pertencente a Itabira (MG), foi percorrido em leito natural, com subidas
generosas e calor saariano. Em Senhora do Carmo, parada para degustar
deliciosos pastéis de queijo. Não tinha Coca; encarei guaraná genérico. Qual não foi a minha surpresa quando a funcionária da lanchonete me informou que o trecho de Senhora do Carmo a Itambé do Mato Dentro (MG) (15 quilômetros) está asfaltado. Maravilha. Com essa falta de chuvas mais robustas, os trechos em leito natural estão muito empoeirados. A última etapa do dia foi feita em asfalto novo e farto em subidas.
Atravessei 36 quilômetros sem qualquer tipo de apoio. Nem bar, nem
povoados, restaurantes ou comunidades. Essa é a maior dificuldade desse trecho
da Estrada Real. Na saída de Itambé do Mato Dentro (MG) um problema na fixação
do alforje direito, porém solucionado rapidamente. Após o décimo quilômetro, a Estrada Real passa por enormes rochas sedimentares, dispostas de forma aleatória às margens do caminho. São imponentes e belas. Daí a origem do nome Itambé, que em língua tupi quer dizer: pedra afiada. Parece uma paisagem lunar. Fotos: Fernando Mendes. Rio do Peixe. Foto: Fernando Mendes. Do alto da
Serra, a 900m de altitude, senti o mundo aos meus pés. Que paisagem
maravilhosa. Ao fundo, o colosso e a imponência das formações da Serra do Cipó.
É para ganhar o dia ver esse espetáculo. Serra do Cipó. Fotos: Fernando Mendes.
Desse
ponto em diante, a Estrada Real inclina fortemente para baixo, dando um refresco para
pernas e pulmões. E desce, desce até chegar ao Vale do Rio do Peixe, com
piscinas naturais e águas cristalinas.
Igreja Matriz de Nossa Senhora do Pilar . Foto: Fernando Mendes. Cheguei à pacata Morro do Pilar (MG) (3.378
habitantes. Censo 2010) às 18h, a Hora do Ângelus, e com chuva se avizinhando. A Igreja Matriz de
Nossa Senhora do Pilar não tem estilo próprio, apesar de a cidade ter sido
importante ponto de apoio às tropas que seguiam para Paraty, levando, em
alforjes presos às mulas, o ouro extraído em Vila Rica, atual Ouro Preto (MG). O arraial (Gaspar Soares) que deu origem à cidade surgiu no alto de um
morro, onde o bandeirante paulista Gaspar Soares encontrou ouro, em 1701. Ali,
construiu uma capela dedicada à Nossa Senhora do Pilar. Há registros de um
desmoronamento em 1743, que teria matado 18 escravos e interrompido as
atividades mineradoras. Morro do Pilar (MG) abrigou o primeiro alto-forno siderúrgico do Brasil, na Fábrica de Ferro Gusa do Brasil - a Real Fábrica de Ferro de Morro do Pilar - que em 1814 conseguiu fazer a primeira corrida de ferro no alto forno A pioneira fábrica funcionou, em regime de produção, mais ou menos regular, de 1814 até cerca de 1830, época em que encerrou suas atividades, de acordo com Carneiro de Mendonça em seu livro "O Intendente Câmara".
Pelos mais variados interesses, a produção de ferro gusa foi transferida para a vizinha Itabira (MG), terra natal do poeta Carlos Drummond de Andrade. E assim, Morro do Pilar (MG) parou no tempo e mantém um ar bucólico e preguiçoso até hoje. Diamantina (MG) a 164 quilômetros.
Apesar da pequena quilometragem do dia - 27 km -, o
calor foi intenso, tanto quanto a altimetria. Sabendo que a etapa não conta com
apoio, a exemplo de ontem, decidi partir após o almoço. O passaporte foi carimbado numa loja - pasmem - que serve café expresso. Tomei 500 ml de açaí e encerrei com delicioso café. Deixei Morro do Pilar às 14h 30, sob Sol saariano e rumei para Conceição do Mato Dentro. Com 15 minutos de pedal, trovoadas e vento forte. Prenúncio de chuva que, infelizmente, ficou na promessa. O trecho é muito bonito, com o Espinhaço mostrando suas formações sem nenhum pudor. Na 1/2 do caminho encontrei o Cássio, ciclista Potiguar, que está percorrendo a Estrada Real de Diamantina a Paraty (RJ). Ficamos um tempo conversados, passei umas informações, nos despedimos e segui rumo a Conceição do Mato Dentro (MG) (18.198 habitantes. Censo 2010).
Fotos: Fernando Mendes. A três quilômetros da chegada a Conceição MoDato, a Estrada Real desemboca na
Rodovia MG - 010, que vem de BH e, após descida alucinante, cheguei ao Down
Town local. Eram 18h 30. Aproveitei o que restava de luz natural e fui à Igreja do Bom Jesus de Matozinhos, uma das mais belas da Estrada Real, embora não seja em estilo barroco.
Em 1931, encontrava-se em péssimo estado de conservação e foi totalmente
demolida e substituída por uma construção moderna. Edificação recente, sem ter
um significado artístico - arquitetônico, o atual Santuário do Senhor Bom Jesus
de Matozinhos merece menção por ser centro de romaria, que se realiza
anualmente pelas festas do Jubileu, entre 14 e 24 de junho, desde os tempos
coloniais.
A decisão de construir a igreja foi tomada pela irmandade em reunião no dia 14 de março de 1931. O lançamento da pedra fundamental ocorreu em 8 de novembro do mesmo ano. O projeto é de autoria do arquiteto Mario Moreira. As linhas arquitetônicas são bastante ecléticas, variando do mourisco ao neogótico. A entronização da imagem do Bom Jesus no Santuário se deu a 12 de maio de 1934. Disponível
em:<https://pousadadagameleira.com.br/atrativos-historicos-culturais-de-conceicao-do-mato-dentro-mg/santuario-do-bom-jesus-de-matozinhos/>.
Acesso: 1º/03/2017. Diamantina a 137 quilômetros.
Na saída de Conceição do Mato Dentro (MG) choveu
muito forte. Foi uma delícia pedalar sob forte aguaceiro, que atenuou do calor
insano, que senti desde a saída de Petrópolis (RJ), 18 dias atrás, quando a
aventura teve início. Choveu até a
parada para o almoço, que aconteceu no pequeno Distrito de Córregos, 432 habitantes, sendo 246 homens e 186
mulheres – Censo 2010 -, fundado há 308 anos e pertencente
a Conceição do Mato Dentro (MG). Igreja de Matriz de Nossa Senhora de Aparecida. Foto: Fernando Mendes. Fundado por bandeirantes em 1702, o Distrito de
Córregos pertenceu ao Serro (MG) até o ano de 1851, passando
a ser distrito de Conceição do Mato Dentro (MG). Situado em um vale de difícil
acesso, no início de sua formação foi núcleo de mineração de ouro e diamantes.
Córregos ou Nossa Senhora Aparecida de Córregos tem
seu casario tipicamente colonial distribuído em uma pequena praça e algumas
ruas. São casas térreas e alguns sobrados, simples e antigos. Almoço simples e pedal girando, agora sem chuva, até chegar à pacata e simpática Santo Antônio do Norte - 662 habitantes, sendo 347 homens e 315 mulheres, Censo 2010 – que abriga a charmosa Igreja do Rosário. A localidade mantém a beleza paisagística de seu sítio e preserva, em decorrência da estagnação econômica, suas características do período colonial. Tapera, como também é conhecida, tem apenas uma rua. Quem ali conseguir a façanha de se perder, ganhará um prêmio. Com o passaporte carimbado, toquei em frente, ou melhor, toquei para cima, pois a última etapa inclui subir a vertente Sul da Serra da Escadinha, [quatro quilômetros] e depois descer a vertente Norte [oito quilômetros] para chegar a Itapanhoacanga, distrito de Alvorada de Minas (MG).
Itapanhoacanga fica encravada em um vale muito profundo e cercada pela Serra do Espinhaço, que recebe denominações locais de Serra do São José, também chamada de “Serra da Escadinha”. Ao longo do Caminho dos Diamantes – trecho compreendido entre Diamantina (MG) e Ouro Preto (MG) -, o Espinhaço recebe diversas nomenclaturas dadas pela população nativa.
Existem monumentos religiosos e ricas manifestações
culturais. O pequeno vilarejo é símbolo da época em que esse diminuto distrito,
na porção central de Minas Gerais, era o mais rico garimpo de ouro do Serro
Frio (arraial que deu origem à cidade do Serro-MG). A reforma da Igreja de São José
(edificação barroca construída entre 1746 e 1787) está emperrada há 17 anos.
Aguarda a liberação de verba. A situação é tão precária que as imagens e peças
sacras foram retiradas e levadas para um local mais seguro.
Disponível
em http://pt.slideshare.net/AndrSchetino/estrada-real-23863559>. Acesso:
1º/03/2017. Diamantina a 89 quilômetros.
Deixei Itapanhoacanga pouco antes das 11h e rumei
na direção de Alvorada de Minas (MG), que teve sua ocupação com o início
da mineração do ouro no Rio do Peixe, a partir de 1712. Em Alvorada de Minas (MG) (3.666
habitantes. Censo 2010) carimbei passaporte, bati uma tigela de açaí na
padoca e fui encarar as subidas honestas até o Serro (MG), com a ER asfaltada
nesse trecho. Cheguei ao Serro (MG) (21.427 habitantes. Censo 2010)
no momento de um apagão que durou horas. O
nome da região, dado pelos índios, era Ivituruí (ivi = vento, turi = morro, huí
= frio) na língua tupi-guarani. Dai derivou Serro Frio atual Serro (MG), uma
das mais belas e antigas cidades históricas de Minas Gerais. Serro é nome de queijo e queijo é sinônimo de Serro. A cidade se orgulha de produzir o mais saboroso e conhecido produto mineiro: o famoso "Queijo do Serro" artesanal, tipo Minas. No estado ele é conhecido também como "queijo minas" (não é curado nem frescal). O motivo do diferenciado sabor, comparável aos melhores do mundo, ou ainda não está devidamente explicado, ou está guardado a sete chaves. Os antigos o creditavam ao capim gordura, excelente pastagem nativa da
região, hoje quase desaparecida. Como permaneceu a mesma qualidade, atualmente
alguns apontam a composição do solo (terreno calcário e úmido) e o clima, como
os responsáveis pelo delicado sabor.
Disponível em:<
https://www.serro.mg.gov.br/portal/turismo/0/9/758/queijo-do-serro>. Acesso:
1º/03/2017.
Sem energia elétrica, a
cerveja do jantar desceu quente. Mas a refeição estava uma delícia. Pouco antes
da meia-noite a energia foi restabelecida. Impossível dormir sem
ar-condicionado. Diamantina (MG) a 64 quilômetros.
Atravessei a ponte sobre o Rio do
Peixe e, após, subida honesta de quatro quilômetros. Almocei assistindo
Escolinha do Professor Raimundo, no Distrito de Três Barras, 23 quilômetros à
frente e pertencente ao Serro (MG).
O núcleo humano de Três Barras
fica às margens do Rio Jequitinhonha e abriga a charmosa Igreja de São
Geraldo (*).
(*) Templo
modesto, mas que se destaca entre o rarefeito casario local. A fachada é
bastante singela, com torre única e central salientada pela cobertura em
telhado de quatro águas, numa feição tipicamente mineira. Embora sem nada que a
distingue especialmente, a Capela de São Geraldo, comove pelo despojamento
e simplicidade. Capela de São Geraldo ocupa
o lugar, com arquitetura tipicamente mineira. Ressalta as características dos
tempos coloniais, destacando-se pela simplicidade de seu contorno em tom azul,
pela torre central única e por seu telhado de quatro águas com seu conjunto
arquitetônico e natural. A modesta capela de São Geraldo registra a
religiosidade do povo do distrito.
Disponível em:< https://www.serro.mg.gov.br/portal/noticias/0/9/747/tres-barras>. Acesso: 1º/03/2017.
A chuva apertou e logo passei por Milho Verde, também Distrito do Serro
(MG) e lugar de pousadas e cachoeiras em profusão. Essa remota localidade
abriga a minúscula Capela do Rosário, que ficou conhecida ao sair no encarte do
LP “Caçador de Mim”, de Milton Nascimento, lançado pela Gravadora Ariola, em
1981. Carimbei passaporte na Pousada do Moraes e pedalei bem tranquilo os sete
quilômetros finais, chegando a São Gonçalo do Rio das Pedras, distrito do
Serro, às 19h. Fui rever o Sr. Ademil e colocar a conversa em dia.
Diamantina (MG) a 32 quilômetros. Há três semanas, estava a 942 quilômetros.
Essa constatação
originou uma reflexão sobre a "autenticidade" do edifício, que,
diferentemente de muitas construções da mesma época no interior brasileiro, não
possuem absolutamente nada de "kitsch".
Uma possível explicação para esse fato é o total isolamento em que se
encontrava Milho Verde na década de 1950, não sendo servida a localidade por
luz elétrica, portanto, não compartilhando das informações da indústria
cultural e, por isso, com um alto grau de "imunização" em relação ao
"kitsch" por ela difundido.
Kitsch: substantivo com origem no alemão
que descreve uma coisa com
mau gosto (âmbito da estética). Conteúdo criado
para apelar ao gosto popular. Disponível em:< https://www.serro.mg.gov.br/portal/noticias/0/9/748/Milho-Verde>.
Acesso: 1º/03/2017.
Acordei com o forte barulho da chuva sobre a
cobertura que dá acesso dos quartos à sala de café da Pousada Fundo de Quintal.
Tomei café e zarparei. Como não sou de açúcar, o aguaceiro não me impediu de
sair. O trecho estava bem enlameado e deveras escorregadio.
Seguia com cautela. Passei pelo bucólico povoado do
Vau, subdistrito de Diamantina (MG), quando a chuva estiou. Daquele ponto em
diante, o asfalto cobriu o leito natural do caminho histórico. “a marcha do progresso
é a minha grande dor”, conforme está na canção Mágoa de Boiadeiro, composição
de Índio Vago e Nonô Basílio, imortalizada na voz de Sérgio Reis. CHEGUEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEEIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIII! |
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